top of page
Foto do escritorSara & Felipa Educa_são

Explorar o Mundo Através do Brincar: Uma Jornada Essencial na Infância

Atualizado: 8 de jan.


"Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos" - esta reflexão de Saint-Exupéry é um lembrete poderoso da importância do brincar, uma jornada vital no desenvolvimento infantil.


A Biologia do Brincar


A importância do brincar, do ponto de vista da biologia evolutiva, pode não ser imediatamente evidente. Historicamente, para humanos e animais, tempo dedicado ao brincar não contribuía diretamente para a sobrevivência imediata. No entanto, a pesquisa moderna desvenda uma realidade diferente. Stuart Brown, psiquiatra e fundador do National Institute for Play nos Estados Unidos, destaca que o brincar é um impulso biológico fundamental. A pesquisa de Brown sublinha que o brincar é tão vital para a nossa saúde e bem-estar quanto o sono e a alimentação. A sua obra é uma referência no entendimento de como o brincar influencia não apenas o desenvolvimento infantil, mas também o comportamento e bem-estar ao longo de toda a vida.


Alimentação, Sono e Brincar: Um Trio Inseparável


A interligação entre alimentação, sono e brincar é fundamental no desenvolvimento das crianças. Cada um destes elementos desempenha um papel vital:


  • Alimentação: Fornece a energia necessária para a atividade física e cognitiva. Uma nutrição adequada é essencial para o crescimento físico e desenvolvimento cerebral, influenciando a capacidade da criança de explorar e interagir com o mundo através do brincar.

  • Sono: É crucial para a consolidação da aprendizagem e para o processamento das experiências vividas durante o dia. O sono adequado permite que as crianças mantenham um nível de energia saudável, essencial para um brincar produtivo e criativo.

  • Brincar: É a forma como as crianças exploram, aprendem e interagem com o mundo. O brincar estimula o desenvolvimento cognitivo, emocional e social, complementando as experiências vividas durante as fases de alimentação e sono.


Estes três aspectos estão interconectados de uma maneira que um influencia e sustenta o outro. Uma alimentação equilibrada e um sono reparador preparam a criança para um brincar mais ativo e engajado, enquanto um brincar estimulante e satisfatório pode melhorar o apetite e a qualidade do sono.


As Fases do Brincar Segundo Mildred Parten


Mildred Parten, uma notável teórica no campo do desenvolvimento infantil, identificou seis fases distintas do brincar, essenciais para o desenvolvimento social e cognitivo das crianças:

1. Brincar Desocupado ou Funcional (0-3 meses): Caracteriza-se por movimentos aleatórios e descobertas sensoriais.

2. Brincar Solitário (0-2 anos): A criança brinca sozinha, desenvolvendo autonomia e imaginação.

3. Brincar de Espectador (2 anos): Observar os outros a brincar, aprende através da observação.

4. Brincar Paralelo (2-3 anos): Brincar perto de outras crianças, começa a perceber a presença dos outros.

5. Brincar Associativo (3-4 anos): Interações iniciais, partilha de brinquedos e experiências.

6. Brincar Cooperativo ou Social (4-6 anos): Brincar organizado e regras estabelecidas em grupo.



Brincar desocupado ou funcional – 0-3 meses

Esse tipo de brincar é o que as crianças fazem desde o nascimento. Para o observador externo pode não parecer brincadeira, podem-lhe parecer movimentos que não servem para nada, mas estes movimentos são considerados um tipo de brincadeira e ajudarão a criança com os seus tipos posteriores de brincar. Esse tipo de brincadeira pode ser tão simples quanto pontapear o ar ou estudar as mãos ou os pés.



Brincar solitário ou sozinho – 0-2 anos

As crianças costumam brincar sozinhas e parecem não se interessar pelo que os outros estão a fazer. Isto é importante porque ensina as crianças a tirar prazer do brincar. A brincadeira solitária acontece desde o nascimento até aos dois anos de idade. É o brincar perfeito quando a sua capacidade de comunicação ainda não está muito desenvolvida. Esse tipo de brincadeira é crucial porque ajuda a criança a aprender a se divertir, o que é uma habilidade importante a aprender. A maioria dos adultos não quer uma criança que precisa de ser constantemente entretida por coisas ou outras pessoas – quer que ela seja capaz de o fazer por si mesma.

Brincar espectador – 2 anos

Esse tipo de brincadeira começa por volta dos 2 anos de idade, embora também possa acontecer muito depois disso. Nesse tipo de brincadeira, uma criança assiste às outras crianças a brincar sem participar. É uma forma de observar o que acontece e de aprender observando os outros. Por vezes, as crianças podem fazer perguntas e definitivamente ficarão interessadas no que está a acontecer, mas não tomam nenhuma iniciativa para se divertir. Os adultos, às vezes, podem se sentir um pouco desconfortáveis quando vêem isto acontecer, muitos pensam que há algo de errado com a criança, mas é uma fase completamente normal do desenvolvimento. As crianças nesta fase ainda não são sociais o suficiente para se divertir com outras crianças , mas podem tirar muitos benefícios das brincadeiras como espectadores. Estas observações é o que lhes dá confiança para levar o seu brincar para o próximo nível e a fazê-lo com outras crianças. Esta é uma forma comum de brincar aos 2 anos, mas pode ocorrer a qualquer momento.



Brincar paralelo – 2-3 anos

O brincar paralelo normalmente começa por volta dos dois anos de idade e pode durar muito tempo. Este acontece quando duas ou mais crianças estão na mesma sala/espaço e brincam próximas, mas não necessariamente umas com as outras. Em vez disso, é mais uma imitação – enquanto elas estão a brincar separadamente, elas apercebem-se uma da outra e podem até espelhar as ações da outra. Elas podem ir buscar brinquedos semelhantes e copiarem-se umas às outras, por exemplo. As habilidades sociais estão a ser aprendidas pela observação. Pois este brincar dá às crianças as noções de boas maneiras, de se revezar, trocar brinquedos, etc... Todas estas ações mostram que uma criança está a começar a querer interagir com as outras crianças.



Brincar Associativo – 3-4 anos


Dos três aos quatro anos de idade, a brincadeira associativa é outro tipo importante de brincadeira que as crianças experimentarão. De certa forma, esse tipo de brincar é semelhante ao brincar paralelo, porque as crianças também brincam separadamente. O que é diferente é que enquanto elas estão a brincar separadamente, elas também estão envolvidas umas com as outras, trabalhando em direção a um objetivo comum. Elas estarão a trabalhar nas suas próprias tarefas enquanto conversam e socializam umas com as outras. É uma das maneiras pelas quais as crianças aprendem primeiro a formar e a manter amizades. As crianças nesta fase estão, muitas vezes, mais interessadas em brincar com os outros do que com brinquedos. Elas já conseguem conversar e interagir umas com as outras e conseguem trocar brinquedos. No entanto, ainda não há regras. Este tipo de brincar desenvolve a resolução de problemas e a cooperação.


Brincar cooperativo/social – 4-6 anos

O brincar cooperativo é uma espécie de mistura de todos os estágios. É onde tudo o que elas aprenderam em todas as outras etapas do brincar se junta. Por esta razão, nos Países Baixos, é esta a altura que as crianças entram para o Jardim de Infância. Até esta idade, as crianças que forem para espaços de cuidados fora de casa estão em creches, amas ou similares. Este é o momento em que as crianças começam a compartilhar brinquedos e criam regras para as suas brincadeiras organizadas. E também, quando a criança começa a fazer os amigos de verdade e a ter companheiros favoritos. Aqui as crianças estão tão interessadas nas pessoas quanto na atividade. Os grupos são mais formalizados e têm geralmente um líder, ou mais. E ao brincar as crianças podem receber muitas vezes papéis diferentes. A brincadeira aqui já é organizada em torno de tarefas específicas e tem objetivos a atingir decididos e desenvolvidos pelo grupo. Esse tipo de brincar reúne as habilidades de todas as outras fases. É muito necessário para interação social e em grupo. Após os 6 anos, assiste-se em muitas brincadeiras, as crianças começarem a dividir-se em grupos masculinos/femininos. Algo que poderá servir para outra reflexão...

Sabemos que o brincar livre parece estar a ser ameaçado de extinção. O tempo e o espaço para brincar verdadeiramente livre está a desaparecer em todo o mundo, e nós adultos estamos também a fazer pouco para proteger o direito da criança ao brincar. Acreditamos que é porque na realidade muitos ainda não compreendem a sua importância. Por isso dedicaremos algum tempo a este tema.


Enquanto os adultos não voltarem a perceber que é ao brincar, que temos a capacidade de desenvolver os nossos processos de vida, ao nosso próprio ritmo e intensidade, teremos de nos obrigar a parar simplesmente e a reaprender a observar!

Pois qualquer adulto que observar uma criança a brincar livremente ficará maravilhada com a incrível perseverança, concentração e atenção interior com que uma criança se liga ao seu mundo, às suas leis naturais e a todos os seus habitantes. E sentirá como dentro da brincadeira, a criança explora, se maravilha e se auto-desenvolve.


Conclusão: O Valor Inestimável do Brincar



Como pais e educadores, é fundamental reconhecer o valor inestimável do brincar no desenvolvimento infantil. Ao observarmos as crianças a brincar livremente, testemunhamos a sua incrível capacidade de aprendizagem e auto-desenvolvimento. Seguindo a sabedoria de Saint-Exupéry, devemos aprender a olhar com o coração para compreender verdadeiramente a essência do brincar.


"Brincar com crianças não é perder tempo, é ganhá-lo; é triste ver meninos sem escola, mas mais triste ainda é vê-los sentados enfileirados em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para a formação do homem." - Carlos Drummond de Andrade


Desafio: Esta semana, observa o brincar do(s) teu(s) filho(s), das tuas crianças, e partilha connosco as tuas observações e descobertas. A tua participação é um passo valioso para reacender a importância do brincar na vida das nossas crianças.



Bibliografia:

Almon, J. & Miller, E. (2011). The crisis in early education: A research-based case for more play and less pressure. Alliance for Childhood. Retrieved from http://www.allianceforchildhood.org/sites/allianceforchildhood.org/files/file/crisis_in_early_ed.pdf


Brown, Stuart (2010). Play : How It Shapes the Brain, Opens the Imagination, and Invigorates the SoulHow it Shapes the Brain, Opens the Imagination, and Invigorates the Soul


Guddemi, M., Sambrook A., Wells, S., Fite, K., Selva, G., &Randel B. (2012, October). Unrealistic Kindergarten Expectations: Findings from Gesell Institute’s Revalidated Developmental Assessment Instrument. Proceedings from the Annual Conference for Early Childhood Research and Evaluation 1. Retrieved from http://www.highscope.org



Comments


bottom of page